Empreendedorismo: o que aprendemos com as olimpíadas

by Juliana Cândido Custodio

Qual é a relação da saída de Simone Biles de uma competição olímpica e da superação de favoritas ao podium Ágatha e Duda, com o dia-a-dia do empreendedor?

Determinação.

Simone Biles é a favorita absoluta da ginástica. Com 25 podiums em campeonatos mundiais e 4 ouros, 1 prata e um bronze de jogos olímpicos, Simone decide em 2021 deixar as olimpíadas no meio do campeonato.

Ágatha e Duda, dupla favorita ao podium do vôlei de praia, com grandes vitórias no currículo como campeonato do mundo, prata no Rio 2016 e liderança em ranking mundial, se despedem das olimpíadas em plenas oitavas de final.

Determinação é a palavra que move guerreiras e vencedoras e separa muito bem o sucesso do fracasso. O privado do público. As conquistas para si das conquistas para os outros.

E, todas as conquistas tem dois lados. Não de quem perde e de quem ganha. Mas, são dois lados também opostos, apesar de andarem juntos, que é o resultado pessoal e o resultado público.

Um resultado público é uma vitória ou uma derrota de algo que as pessoas torcem. Algumas vezes, essa torcida é à favor, mas sabemos que existe sempre a torcida do outro. Existe o desejo nosso e o desejo do outro.

Um resultado público enobrece, engrandece, vangloria, enche o ego. Encher o ego não é algo negativo. É dar força para um dos lados maiores dessa conquista: o eu. A valorização e reconhecimento de si mesmo.

E, esse é o limite entre uma vitória pública, um resultado, seja por um placar de jogos, um pódio e medalha, e a linha tênue entre a vitória pessoal. Ora, um resultado que todo mundo vê depende de muitos pequenos e grandes resultados privados. São as conquistas pessoais que ninguém – ou quase ninguém – vê.

Resultado é só um ponto. É só um momento. E todo resultado, independente do que seja, é incapaz de definir um processo. O resultado pode ter sido excelente. Uma vitória. Um ouro, uma prata, um bronze. Mas, todo resultado depende de um percurso. E, muito mais vale um percurso de ouro para qualquer resultado, que um percurso de derrotas para um podium.

Nesse percurso, tudo é um processo de construção. Uma jornada. Não de vitórias e de derrotas, mas de conquistas. E conquistas estão muito mais ligadas ao percurso, à trajetória, que ao resultado. Pois, as conquistas são pessoais. É a batalha interna que se constrói não apenas num pequeno percurso que se vê. Mas em uma longa jornada que se vive. E, viver de forma determinada é a principal conquista que uma pessoa vitoriosa pode ter.

A vitória pessoal fala muito mais de força que a vitória pública. A vitória pública, aquela que todo mundo vê, da alegria, enche o peito de orgulho (dos outros), dá fama, enobrece a autoridade. É passageira e traiçoeira se não souber levar. A vitória pessoal  é a que forma o caráter, a que dá alegrias e tristezas de saber quem se é e o que se quer. É a que se torna motivo de lutarmos e de levantarmos todas as manhãs. E, principalmente, é a que constrói quem somos.

Quem vê uma vitória pontual, ou uma derrota, muitas vezes esquece de ver a vitória pessoal, as conquistas: o resultado de todo um percurso que pode ter sido o resultado de uma vida de determinação.

Lembra que eu falei de determinação como a maior conquista?

Em um país onde o parecer pode ser mais importante que o ser. Em um momento delicado em que toda ação do presente determina um futuro que, muitas vezes, pode não ser mais mudado. Em um sonho que é muito mais seu e de mais ninguém. Nunca podemos nos esquecer da beleza e das conquistas da jornada de determinação que tivemos. Essa é a nossa maior conquista e a que ninguém nos tira.

A determinação carrega muito da certeza de ser quem se é, sem precisar provar nada para ninguém. É muito mais sobre autoconfiança, autoestima e valorização de si mesmo que só foco em resultados.

A determinação diz muito sobre a força de lutar pelo que se quer. E, mesmo que pareça fácil aos olhos do outro, toda luta deve ter um objetivo. Mas, pouca gente valoriza o ato de se ter esse objetivo. O objetivo é algo que se quer para si e não para os outros. Por isso, não podemos confundi-lo com resultado. Objetivo é aquilo que vai aquecer nosso coração independente do que seja. Independente do resultado que traga. Porque resultado é o final de um processo, e se nosso objetivo é diferente do resultado, quer dizer que esse processo ainda não chegou ao fim. E determinado daqueles que sabem quando continuar atrás de seus sonhos ou de buscar novos.

Eu venho do mundo do esporte. Joguei por 8 anos de campeonatos info-juvenis a adultos, de times de base a seleções e campeonato brasileiro. E até a minha saída foi controversa. Quando eu parei? No final das seletivas para um campeonato brasileiro. Onde muitas outras atletas gostariam de ter chegado, eu cheguei e abri mão. Da noite pro dia. Não foi rejeição e sim escolha. E essa não foi a primeira e nem a última vez que tomei decisões como essa. Tive muitas vitórias, muitas derrotas, mas acima de tudo, muitas conquistas, pois esporte é superação e aprendizado pessoal. 

Então, particularmente, o paralelo que eu faço entre Simone Biles e a sua desistência de provas olímpicas, Ágatha e Duda e sua superação pelas alemãs em oitavas de final sendo favoritas, e a sua relação com o empreendedorismo, diz muito mais sobre realização e conquistas pessoais e a relação entre segurança interna e a avaliação externa. 

Tanto no esporte quanto no empreendedorismo, conquistas e fracassos tem uma linha muito tênue entre vitórias e derrotas pessoais e públicas. É uma pressão interna e externa. O que precisamos reconhecer são os limites disso e a importância de cada um deles para nós mesmos.

E essa é a questão: onde a conquista pública lidera e se sobressai à conquista pessoal sempre pode ser prejudicial. O raciocínio é simples: quando temos uma tarefa para desempenhar e que nos desafia, essa tarefa passa a ser vista como uma possível fonte de realização (passageira ou não) pessoal. Pode ser subir numa árvore para quem tem muito medo de altura, uma apresentação importante para quem tem insegurança do seu trabalho ou medo de falar em público ou mesmo outras atividades ainda mais simples. Qual é a diferença? 

Subir numa árvore não é importante para o outro e não é uma competição por posição. É algo predominantemente pessoal. Não contamos para os outros, os outros não dependem disso, e não tem muita coisa em jogo, apenas nossa própria segurança. Já uma apresentação, por mais que seja individual, pode ser uma competição por resultados, status, reconhecimento, etc. 

A realização e a conquista das duas atividades (subir na árvore ou fazer uma apresentação) existe para o lado pessoal. No entanto, uma apresentação também é uma realização pública, ou seja, depende de como os outros vão avaliar, pensar e reagir a essa apresentação, por melhor que ela seja. Então, a apresentação exerce muito mais pressão externa em uma conquista que deixa de ser apenas pessoal de ter um bom resultado no seu trabalho e ter o medo superado de falar em público e se torna “o que os outros vão pensar, avaliar e julgar”. E, quando vivemos em função da apreciação, validação ou comprovação do nosso valor pelo outro, para entendermos a nossa própria realização, isso sim se torna prejudicial ao desempenho e realização pessoal. O mundo externo sobressai ao mundo interno. Traduzindo, quem não paga nossas contas passa a representar muito mais do que quem realmente paga 😂 (a não ser que seja um patrocinador, aí até entende-se 🤭😅)

Com pessoas altamente competitivas ou perfeccionistas e, principalmente aquelas que lutam por posições, por aceitação e por resultados públicos, nada é pior que um segundo lugar. O segundo lugar para quem é acostumado a sempre ter o primeiro, é muito mais dolorido que o último para quem tem bons resultados no trajeto ou objetivos pessoais bem claros. Percebeu a diferença? Não é o lugar ou resultado da conquista que conta tanto. Mas o olhar e validação da perfeição desse resultado pelo outro. E isso é o prejudicial.

No vôlei quando eu jogava, brincávamos que o peso de um bronze é muito maior e mais gratificante que uma prata. Por quê? Em esportes coletivos, o bronze vem de uma vitória, é conquistado e aplaudido pelo público após o jogo. A prata é uma derrota, que mesmo aplaudida, é ofuscado pelo ouro. Então, para quem sempre está acostumado a ganhar, uma derrota é mais prejudicial que ter perdido a vida inteira.

A não ser para os verdadeiros vitoriosos. Quem são eles? Aqueles que valorizam o percurso. Amam a competição pela superação. O resultado? É só resultado. É saber aceitar, melhorar e continuar na luta, afinal, para esses, a determinação pessoal é o que conta. E que determinação de dar inveja!

Para os atletas, as vezes são anos, ou as vezes é uma vida toda dedicada ao esporte. Dedicação em se superar a cada dia. Em conquistar movimentos e resultados pessoais cada vez melhores a cada dia. Essa é a natureza de um campeão.

Para o empreendedor é a mesma competição: interna e externa. As conquistas são esperadas pelo empreendedor (realização pessoal) e os resultados dessas conquistas, são necessários para o reconhecimento do outro, seja da família, dos amigos e dos próprios clientes (realização pública). Mas, o foco do empreendedor deve ser em atingir o seu objetivo, o que o moveu para criar seu negócio e o problema que queria resolver. Não é o resultado esperado pelos outros. É o objetivo atingido por você.

Hoje, com as redes sociais vemos cada vez mais essa necessidade de se mostrar vitórias e reconhecimento público para demonstrar seu próprio valor. E não ao contrário, principalmente em redes profissionais. Estranha essa lógica, não? Não apenas estranha, altamente prejudicial. E, quando um simples resultado determina um atleta ou um empreendedor?

E aí é onde mora o perigo. O melhor atleta não é aquele que ganha sempre, apenas. É aquele que luta para construir e ser o melhor que pode a cada dia e passar isso como exemplo e inspiração para os outros. Pois, ele sabe que o esporte é superação. É força. É garra. É luta para mudar e se tornar melhor. Não para os outros, mas para si mesmo.

O melhor empreendedor não é necessariamente aquele que vence, que ganha muito dinheiro ou aquele que conquista mais. Mas, é aquele mais resistente a críticas, a tombos e a muitos segundos lugares, sem desistir e sem se abalar com olhares e cochichos dos outros. Pois, ele sabe que empreender é uma caminhada e existem vírgulas e pontos de exclamação e de interrogação para crescimento na trajetória e não pontos finais para um sonho.

Por isso, muitas vezes, a melhor realização é a que se tem em silêncio, para si, pelas conquistas pessoais, para se preservar da pressão por realização e olhar competitivo dos outros. É aquela que aquece o coração por dentro. Porque empreender e competir em campeonatos são mais que realizações. São sonhos. E sonhos são nossos, são pessoais. E não públicos. 

Resultados como da dupla olímpica de vôlei de praia Agatha e Duda e decisões como a de Simone Biles, e mesmo as que tive ao longo da minha vida, como atleta ou não, mostram muito mais da relação entre a pressão externa e o que se quer para si que a relação entre conquista e fracasso. 

Não ir para um podium não pode ser visto com um fracasso. Jamais! Afinal, é se chegar onde muitos queriam estar. É saber o quanto se suou a camisa para estar ali e saber que tem muita gente ao seu lado torcendo por você sempre. É trajetória, é garra, é determinação. Repleta de conquistas, sim!!! E ninguém tira esse mérito do trajeto de ninguém.

A desistência também não deve ser encarado como um fracasso para quem é altamente competitivo. A desistência é uma vitória. Pois, é uma opção. É o poder de controle. É sair realizado e em busca de outras coisas que nos satisfaçam mais e façam mais sentido para nós. É ter coragem de mudar de rumo quando ninguém espera. 

Mais que saber perder e saber a hora de desistir ou de parar é saber reconhecer seu momento. Isso é um ato de autopreservação. Preservação de conquistas, de amor próprio e de autoafirmação diante dos outros. A desistência de uma prova ou saber perder e valorizar trajetória e conquistas, mostra muito mais de coragem, autocontrole e de segurança em si mesmo do que uma vitória sem brilho do trajeto.

Por isso, no empreendedorismo, aprenda com as pratas, cante menos o ouro e valorize todo e qualquer resultado do processo. E quando necessário, saiba perder ou desistir, pois isso não é perder ou renunciar para si. Mas é saber valorizar e preservar todas as outras conquistas mais valiosas que é o caminho.

E você? Qual é o seu comportamento competitivo no seu negócio? E o que reluz ao seu redor? Será que realmente é só o ouro do resultado ou os brilhantes de todo um percurso?

Texto inspirado na minha grande amiga, fonte de orgulho e inspiração, Ágatha.

 

Imagem: G1 Notícias

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